Criadora de uma plataforma que conecta designers e consumidores, ela indica onde encontrar peças feitas em baixa escala por artistas do Sul
Todos os lugares dessa seleção para você conhecer melhor por aqui
Av. Padre Cacique, 2.000 - Cristal
Porto Alegre
R. Silva Jardim, 120 - Auxiliadora
Porto Alegre
R. dos Andradas, 736 - Centro Histórico
Porto Alegre
Ela tem um bicho carpinteiro! Os moradores mais antigos do Rio Grande do Sul conhecem essa expressão e, quem convive com a professora e empresária Camila Farina, idealizadora da Open Feira de Design, certamente dirá que ela se encaixa perfeitamente no ditado. Quem tem um bicho carpinteiro no corpo é uma pessoa inquieta, que nunca fica parada – nada mais adequado a quem, em plena pandemia, transformou sua ideia original, de reunir em uma feira os criadores de design independente no Estado, em um marketplace que se ramifica em plataforma para conectar designers e consumidores, em um ambiente de fomento e incentivo ao design independente gaúcho.
Mas, antes de falar sobre o que o bicho carpinteiro faz, convém apresentá-lo. Porto-alegrense do bairro Menino Deus, Camila concluiu a graduação em Design e emendou um mestrado em História da Arte. Como professora do curso de Design, passou a se envolver cada vez mais na cena cultural de Porto Alegre, especialmente em exposições e mostras de arte. Foi um caminho natural até que fundasse a Maria Cultura, empresa de produção cultural voltada à indústria criativa que toca até hoje. “Fui buscando novos interesses e as coisas foram acontecendo, tudo conectado. Minha trajetória é híbrida”, destaca Camila.
Com seus alunos, fazia frequentes viagens para imersão em projetos voltados aos variados aspectos do design – um dos destinos preferenciais era Buenos Aires, onde a cena de design independente é pulsante e ocorre em eventos, feiras e ateliês. Em 2014, ano complicado para a economia brasileira, muitos designers formados nas universidades da região não conseguiam colocação na indústria e tampouco tinham espaços adequados para expor suas criações e comercializá-las. "Na capital argentina, caminhando por entre as ruas de Palermo, pensei em criar uma feira de design inspirada no estilo portenho para expor as criações dos produtores locais", lembra. Nascia assim, em 2015, a Open Feira de Design.
O conceito é amplo, mas Camila o define dentro das suas balizas: é a produção criativa e não industrial de peças nas áreas de moda, mobiliário, decoração e utilitários em geral, que não é absorvida pelas grandes lojas de departamentos ou pelos varejos localizados em shopping centers. Quem produzia segundo esse modelo foi atraído pela proposta da Open Feira, cujas edições iniciais foram realizadas no Pátio Ivo Rizzo, no bairro Moinhos de Vento. “Já na estreia tivemos três mil pessoas, foi um sucesso. Era uma demanda gigante, que ninguém sabia que existia”, lembra.
O projeto logo foi crescendo e conquistando cada vez mais gente. Diferentes locais da cidade passaram a ser ocupados pelas feiras, que chegaram a reunir mais de mil designers ao longo dos anos. Em 2017, muitos profissionais sentiam a necessidade de formalização para crescer no mercado. Chegou então uma parceria com o Sebrae para preparar os empreendedores. Resultado: mais de 400 designers com negócios formalizados. Além disso, oficinas e workshops sobre variados temas foram ministrados – tudo para fomentar o design independente e torná-lo uma opção viável para criadores e consumidores. Entre 2015 e 2019, Camila e a Open Design realizaram mais de 100 feiras em diferentes espaços da cidade, reunindo mais de 70 mil pessoas.
Um dos bairros mais tradicionais de Porto Alegre, o Menino Deus fica no meio do caminho entre o Centro Histórico e a Zona Sul. Isso representa bem mais do que a informação geográfica no GPS. Quase tão antigo quanto o Centro, o Menino Deus é um recanto residencial em que se pode fazer praticamente tudo a pé, com lojinhas, cafés, restaurantes e bares em abundância. Já a Zona Sul nasceu como recanto de veraneio das famílias porto-alegrenses mais abastadas, o que fez permanecer sua feição rural até pouco tempo. Nos últimos anos tem aumentado a densidade populacional da região, o que fez surgir mais serviços, mas o local ainda é reconhecido como zona residencial, calma e silenciosa. Pois foi entre esses dois polos que Camila passeou por sua trajetória.
Depois de sair do Menino Deus, passou a viver na Tristeza, coração da Zona Sul. É na tranquilidade das ruas arborizadas do bairro que ela cria a filha de seis anos. É por ali também que deixa extravasar o tal bicho carpinteiro que vive nela, inventando maneiras de ocupar variados locais da cidade com suas ideias e propostas – no mundo real ou virtual.
Durante a pandemia, com a impossibilidade de realizar eventos presenciais, a Open Feira de Design evoluiu para se transformar em uma plataforma para criar conexões, divulgando e expandindo a cultura do design independente. Por meio de eventos presenciais e on-line, a Open Design Independente conecta consumidores, formadores de opinião e produtores, impulsionando a cena no Sul do Brasil. “A tendência do localismo no design é muito recente, mas queremos desbravar as nossas características, as nossas possibilidades. Queremos descobrir quem somos pelo design”, explica.
As ocupações ao redor da cidade continuam, mas ocorrem em formato select, preferencialmente no Instituto Ling, local pelo qual Camila vem se apaixonando cada vez mais. Um espaço que respira arte e cultura, segundo ela, tem tudo a ver com a proposta de apresentar o design independente do Sul do País para variados públicos. “Nosso objetivo agora é furar bolhas e promover a inclusão e a diversidade. Estou muito interessada no que se faz de design negro, ou em comunidades periféricas. Queremos descobrir e conectar gente que produz coisas diferentes, originais”, afirma.
Por meio da Comunidade Open, os designers independentes do Sul do Brasil passam a integrar uma rede com fartura de conexões, networking e conteúdo sobre o tema, o que gera oportunidade de qualificação, desenvolvimento e, principalmente, negócios. No Laboratório Open, outro braço do projeto, os designers e criadores têm apoio para vender sua produção no ambiente digital. “Estamos consolidando um nicho de mercado que ainda está nascendo, é tudo muito novo. O design independente é um conceito. Mas nosso projeto prova que ele tem muita força”, completa.
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